João (I)
Quando João nasceu, não sonhava, não podia imaginar que vida o esperava.
Já ninguém sabe onde ocorreu o nascimento. Talvez em casa, talvez num hospital, não se sabe. Apenas que tal foi a 24 de Dezembro de um ano há muito passado.
Era a Véspera de Natal. Nevava. Flocos de um branco puro caíam, suavemente, de nuvens tão escuras que parecia impossível que delas brotasse tal alvura. O frio era muito. Avermelhava a ponta do nariz, congelava as mãos, prendia os movimentos, impunha a vontade irresistível de ficar na cama, tapado pelos cobertores, ouvindo o suave toque da neve nos vidros das janelas.
Nesse dia, contrastando com a paz de Inverno, Maria gritou. Gritos desesperados, enquanto o médico ou alguma velha parteira, especialista pela longa experiência na aldeia, lhe ordenava que fizesse força.
- Com força! Empurre! Respire, vá…
E ela empurrava. Um frio de rachar na rua e Maria que suava em bica.
- Já vejo a cabeça! Só mais um bocadinho!
Um novo alento, que o sofrimento estava prestes a acabar. Lá saiu, por entre um berreiro interminável, coberto de sangue, quase roxo.
- Tem aqui um belo rapagão!
E Maria suspirou de alívio. Tinha dado à luz o filho e João via pela primeira vez o mundo, numa mancha enevoada.
Pequenino, frágil, com as bochechas muito rosadas e uma calvície que em breve desapareceria. As mãos minúsculas agarravam com força os dedos de todos os que se abeiravam do berço, como se os quisesse prender junto de si. Mas a mão que João mais desejava agarrar não se estendia. Maria não queria ser mãe. O filho surgira por acidente e não sabia sequer quem era o pai. Mas sabê-lo ou não pouco adiantava. Ficou com o filho, claro, mas não parecia querer amá-lo.
(continua)
Já ninguém sabe onde ocorreu o nascimento. Talvez em casa, talvez num hospital, não se sabe. Apenas que tal foi a 24 de Dezembro de um ano há muito passado.
Era a Véspera de Natal. Nevava. Flocos de um branco puro caíam, suavemente, de nuvens tão escuras que parecia impossível que delas brotasse tal alvura. O frio era muito. Avermelhava a ponta do nariz, congelava as mãos, prendia os movimentos, impunha a vontade irresistível de ficar na cama, tapado pelos cobertores, ouvindo o suave toque da neve nos vidros das janelas.
Nesse dia, contrastando com a paz de Inverno, Maria gritou. Gritos desesperados, enquanto o médico ou alguma velha parteira, especialista pela longa experiência na aldeia, lhe ordenava que fizesse força.
- Com força! Empurre! Respire, vá…
E ela empurrava. Um frio de rachar na rua e Maria que suava em bica.
- Já vejo a cabeça! Só mais um bocadinho!
Um novo alento, que o sofrimento estava prestes a acabar. Lá saiu, por entre um berreiro interminável, coberto de sangue, quase roxo.
- Tem aqui um belo rapagão!
E Maria suspirou de alívio. Tinha dado à luz o filho e João via pela primeira vez o mundo, numa mancha enevoada.
Pequenino, frágil, com as bochechas muito rosadas e uma calvície que em breve desapareceria. As mãos minúsculas agarravam com força os dedos de todos os que se abeiravam do berço, como se os quisesse prender junto de si. Mas a mão que João mais desejava agarrar não se estendia. Maria não queria ser mãe. O filho surgira por acidente e não sabia sequer quem era o pai. Mas sabê-lo ou não pouco adiantava. Ficou com o filho, claro, mas não parecia querer amá-lo.
(continua)
0 Comments:
Enviar um comentário
<< Home